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08 fevereiro 2008

ATENÇÃO

Já são, no mínimo, duas entidades de classe (CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – ADI 4010; CONFEDERAÇÃO NACIONAL DAS PROFISSÕES LIBERAIS – CNPL – ADI 4006) que moveram ações diretas de inconstitucionalidade junto ao STF com o objetivo de ver declarada a inconstitucionalidade da Instrução Normativa nº 802, de 27.dez.07, que possibilita a quebra do sigilo bancário de pessoas físicas e jurídicas, sendo as primeiras quando apresentarem movimentação financeira acima de R$ 5.000,00, e as segundas quando movimentarem valores acima de R$ 10.000,00.
Por óbvio, se já não fossem os tributos escorchantes impostos a população, e também as empresas, busca o atual Governo Federal, através de clara demonstração de afronta a Constituição da República, quebrar o sigilo bancário para fiscalizar e punir aqueles que já alimentam a sanha devoradora dos ditos governantes.
Pois bem, afora o desabafo, a questão jurídica posta em discussão reside na violação direta e inescusável ao artigo 5º, inciso XII da Constituição da República de 1988 assim redigido:
“XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;”
Analisando-se o dispositivo constitucional acima, erigido a cláusula pétrea, necessário se faz a leitura do ato governamental que produziu a excrescência normativa. Vejamos o que diz a Instrução Normativa nº 802:

"INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 802, DE 27 DE DEZEMBRO DE 2007

Dispõe sobre a prestação de informações de que trata o art. 5º da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001.O SECRETÁRIO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL, no uso da atribuição conferida pelo art. 224, inciso III, do Regimento Interno da Secretaria da Receita Federal do Brasil, aprovado pela Portaria MF nº 95, de 30 de abril de 2007, e tendo em vista o disposto no art. 5º da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001, e no art. 5º do Decreto nº 4.489, de 28 de novembro de 2002, resolve:
Art. 1º As instituições financeiras, assim consideradas ou equiparadas nos termos dos §§ 1º e 2º do art. 1º da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001, devem prestar informações semestrais, na forma e prazos estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), relativas a cada modalidade de operação financeira de que trata o art. 3º do Decreto nº 4.489, de 2002, em que o montante global movimentado em cada semestre seja superior aos seguintes limites:
I - para pessoas físicas, R$ 5.000,00 (cinco mil reais);
II - para pessoas jurídicas, R$ 10.000,00 (dez mil reais).
§ 1º As operações financeiras de que tratam os incisos II, III e IV do art. 3º do Decreto nº 4.489, de 2002, deverão ser consideradas de forma conjunta pelas instituições financeiras, para fins de aplicação dos limites de que tratam os incisos I e II do caput.
§ 2º As informações sobre as operações financeiras de que trata o caput compreendem a identificação dos titulares das operações ou dos usuários dos serviços, pelo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), e os montantes globais mensalmente movimentados.
Art. 2º Na hipótese em que o montante global movimentado no semestre referente a uma modalidade de operação financeira seja superior aos limites de que tratam os incisos I e II do art. 1º, as instituições financeiras deverão prestar as informações relativas às demais modalidades de operações ou conjunto de operações daquele titular ou usuário de seus serviços, ainda que os respectivos montantes globais movimentados sejam inferiores aos limites estabelecidos.
Art. 3º Esta Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir de 1º de janeiro de 2008."


O sigilo bancário, sendo espécie do gênero sigilo de dados, pode ter sua proteção violada, sobretudo em casos excepcionais, inclusive com decisões proferidas pelo próprio STF, porém, somente dentro da excepcionalidade aludida é que se pode afastar tal proteção, sob pena de desestabilizar as relações de segurança jurídica do jurisdicionado.
Analisando o tema da excepcionalidade, o Congresso Nacional editou a Lei Complementar nº 105 que regula hipóteses de quebra do sigilo bancária, dentre as quais não se encontra as hipóteses da Instrução Normativa nº 802, vejamos trecho do texto legal:

Lei Complementar n° 105, de 10 de janeiro de 2001
Art. 1º
(...)
§
3° Não constitui violação do dever de sigilo:
I - a troca de
informações entre instituições financeiras, para fins cadastrais, inclusive por
intermédio de centrais de risco, observadas as normas baixadas pelo Conselho
Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil;
II - o fornecimento de informações constantes de cadastro de emitentes de cheques sem
provisão de fundos e de devedores inadimplentes, a entidades de proteção ao
crédito, observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo
Banco Central do Brasil;
III - o fornecimento das informações de que trata o § 2° do art. 11 da Lei n° 9.311, de 24 de outubro de 1996;
IV - a comunicação, às autoridades competentes, da prática de
ilícitos penais ou administrativos, abrangendo o fornecimento de informações
sobre operações que envolvam recursos provenientes de qualquer prática
criminosa;
V - a revelação de informações sigilosas com o consentimento expresso dos interessados;
VI - a prestação de informações nos termos e condições estabelecidos nos arts. 2° , 3° , 4° , 5° , 6° , 7° e 9 desta Lei Complementar.
§ 4° A quebra de sigilo poderá ser decretada, quando necessária para apuração de ocorrência de qualquer ilícito, em qualquer fase do inquérito ou do processo judicial, e especialmente nos seguintes crimes:
I - de terrorismo;
II - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;
III - de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado a sua
produção;
IV - de extorsão mediante seqüestro;
V - contra o sistema financeiro nacional;
VI - contra a Administração Pública;
VII - contra a ordem tributária e a previdência social;
VIII - lavagem de dinheiro ou ocultação de bens, direitos e valores;
IX - praticado por organização criminosa.
Art. 2° O dever de sigilo é extensivo ao Banco Central do Brasil, em relação às operações que realizar e às informações que obtiver no exercício de suas atribuições.
§ 1° O sigilo, inclusive quanto a contas de depósitos, aplicações e investimentos mantidos em instituições financeiras, não pode ser oposto ao Banco Central do Brasil:
I - no desempenho de suas funções de fiscalização, compreendendo a apuração, a qualquer tempo, de ilícitos praticados por controladores, administradores, membros de conselhos estatutários, gerentes, mandatários e prepostos de instituições financeiras;
II - ao proceder a inquérito em instituição financeira submetida a regime especial.
§ 2° As comissões encarregadas dos inquéritos a que se refere o inciso II do § 1° poderão examinar quaisquer documentos relativos a bens, direitos e obrigações das instituições financeiras, de seus controladores, administradores, membros de conselhos estatutários, gerentes, mandatários e prepostos, inclusive contas correntes e operações com outras instituições financeiras.
§ 3° O disposto neste artigo aplica-se à Comissão de Valores Mobiliários, quando se tratar de fiscalização de operações e serviços no mercado de valores mobiliários, inclusive nas instituições financeiras que sejam companhias abertas.
§ 4° O Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários, em suas áreas de competência, poderão firmar convênios:
I - com outros órgãos públicos fiscalizadores de instituições financeiras, objetivando a realização de fiscalizações conjuntas, observadas as respectivas competências;
II - com bancos centrais ou entidades fiscalizadoras de outros países,
objetivando:
a) a fiscalização de filiais e subsidiárias de instituições financeiras estrangeiras, em funcionamento no Brasil e de filiais e subsidiárias, no exterior, de instituições financeiras brasileiras;
b) a cooperação mútua e o intercâmbio de informações para a investigação de atividades ou operações que impliquem aplicação, negociação, ocultação ou transferência de ativos financeiros e de valores mobiliários relacionados com a prática de condutas ilícitas.
§ 5° O dever de sigilo de que trata esta Lei Complementar estende-se aos órgãos
fiscalizadores mencionados no § 4° e a seus agentes.
§ 6° O Banco Central do Brasil, a Comissão de Valores Mobiliários e os demais órgãos de fiscalização, nas áreas de suas atribuições, fornecerão ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, de que trata o art. 14 da Lei n° 9.613, de 3 de março de 1998, as informações cadastrais e de movimento de valores relativos às operações previstas no inciso I do art. 11 da referida Lei.
Art. 3° Serão prestadas pelo Banco Central do Brasil, pela Comissão de Valores
Mobiliários e pelas instituições financeiras as informações ordenadas pelo Poder
Judiciário, preservado o seu caráter sigiloso mediante acesso restrito às partes, que delas não poderão servir-se para fins estranhos à lide.
§ 1° Dependem de prévia autorização do Poder Judiciário a prestação de informações e o fornecimento de documentos sigilosos solicitados por comissão de inquérito administrativo destinada a apurar responsabilidade de servidor público por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido.
§ 2° Nas hipóteses do § 1° , o requerimento de quebra de sigilo independe da existência de processo judicial em curso.
§ 3° Além dos casos previstos neste artigo o Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários fornecerão à Advocacia-Geral da União as informações e os
documentos necessários à defesa da União nas ações em que seja parte.
Art. 4° O Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários, nas áreas de suas atribuições, e as instituições financeiras fornecerão ao Poder Legislativo Federal as informações e os documentos sigilosos que, fundamentadamente, se fizerem necessários ao exercício de suas respectivas competências constitucionais e legais.
§ 1° As comissões parlamentares de inquérito, no exercício de sua competência constitucional e legal de ampla investigação, obterão as informações e documentos sigilosos de que necessitarem, diretamente das instituições financeiras, ou por intermédio do Banco Central do Brasil ou da Comissão de Valores Mobiliários.
§ 2° As solicitações de que trata este artigo deverão ser previamente aprovadas pelo Plenário da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, ou do plenário de suas
respectivas comissões parlamentares de inquérito.
Especificamente a nós advogados, além da previsão constitucional, e da regulação da matéria em Lei Complementar, há ainda a Lei n° 8.906, de 4 de julho de 1994, que protege o sigilo bancário, vejamos:

Art. 7° - São direitos do
advogado:

I - exercer, com liberdade, a profissão em todo o território nacional;

II - ter respeitada, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas comunicações, inclusive telefônicas ou afins, salvo caso de busca ou apreensão determinada por magistrado e acompanhada de representante da OAB;

(...)

XIX - recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que constitua sigilo
profissional;

Sendo assim, resta latente que a malsinada Instrução Normativa não merece manter-se presumidamente constitucional, pois além da violação a Constituição da República e afrontas legais, não parece que a mesma demonstra ter resultado prático que não possa ser alcançado por outros meios de fiscalização da Receita Federal que não violem direto fundamental do contribuinte.

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