O projeto de lei, abaixo citado, beira o absurdo, e isso porque a atual legislação processual já garante mecanismos para que as partes possam produzir suas provas, considerando a responsabilidade que incumbe a cada uma delas, bem como permite ao juiz produzir provas sempre que for necessário a prestação jurisdicional.
Como se observa, na atual sistemática do Código de Processo Civil, em seu artigo 333, a regra é a distribuição do ônus da prova a parte autora que alega fato constitutivo, e ônus a parte ré que alega fato impeditivo, modificativo ou extintivo.
Como exceção, o juiz poderá determinar de ofício a realização de provas para instruir o processo, é o que se extrai do artigo 130 do Código de Processo Civil que não deixa margens para dúvidas.
E não se diga que da atuação do juiz que determinar a realização de prova se estará aviltando a inércia e imparcialidade inerente a atividade jurisdicional, ou que se estará subtraindo direito da parte em requerer e produzir prova, uma vez que o juiz resta absolutamente comprometido com uma prestação jurisdicional justa e de qualidade, razão pela qual a determinação de provas pode - e deve - surgir nas situações fáticas processuais.
José Carlos Barbosa Moreira[1] leciona sobre o tema:
“Falta enfrentar esta questão: quid iuris, se não vem aos autos a prova de alguma fato relevante? Um modo de lidar com tal situação é lançar as conseqüências desfavoráveis da carência probatória sobre o litigante a quem aproveitaria o fato não provado. Nessa perspectiva, as leis costumam estabelecer regras sobre o chamado ônus probandi: v.g., no Código de Processo Civil brasileiro, o art. 333, cujo caput distribui o ônus entre o autor, para o fato constitutivo do alegado direito, e o réu, para os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos dele.
É essa a única possível solução? Não poderá o juiz, por sua própria iniciativa, ordenar a realização de prova destinada a suprir a lacuna? Sempre nos pareceu, e parece a muitos outros, que a semelhante pergunta se há de responder afirmativamente.”
Para Cândido Rangel Dinamarco[2] a situação não é diferente:
“No processo civil moderno, que exalta a necessidade de obter resultados, incrementam-se os poderes do juiz no sentido de suprir deficiências das partes e seus procuradores (especialmente em matéria probatória) e de emprenhar-se na imposição do cumprimento das obrigações, especialmente das de fazer ou de não-fazer, inclusive mediante atos de pressão psicológica sobre o obrigado (CPC, art. 461).”
No mesmo sentido, Humberto Theodoro Júnior[3]
“Eis por que o juiz, no processo moderno, deixou de ser simples árbitro diante do duelo judiciário travado entre os litigantes e assumiu poderes de
iniciativa para pesquisar a verdade real e bem instruir a causa.”
Neste sentido, não há como concordar com a necessidade de produção de lei que venha a modificar o atual sistema de distribuição de ônus probatório, e ainda venha a influenciar nos poderes de instrução do juiz, pois considerando que no atual sistema a atuação do juiz na instrução probatória seja exceção, a considerar o que propõe o projeto de lei, a regra será a distribuição do ônus da prova a partir de análise do juiz, o que importará em excessivo poder nas mãos do magistrado e gerar injustiças.
Por fim, o aludido projeto de lei não define em que momento da instrução processual o juiz se utilizará da faculdade relativa a distribuição do ônus da prova, o que poderá provocar tumultos processuais acaso o juiz estabeleça tal ônus após a apresentação de resposta a peça inicial, ou, por absurdo, após a audiência de instrução e julgamento.
[1] Moreira, José Carlos Barbosa, Temas de Direito Processual (Nona Série), Rio de Janeiro, Ed. Saraiva, 2007, p. 95.
[2] Dinamarco, Cândido Rangel, Instituições de Direito Processual Civil, 4ª edição, São Paulo, Malheiros Editores, 2004, p. 332.
[3] Júnior, Humberto Theodoro, Curso de Direito Processual Civil, vol. I, São Paulo, Editora Forense, 1993, 416.
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Reportagem - Janary JúniorEdição - Noéli Nobre(Reprodução autorizada desde que contenha a assinatura 'Agência Câmara')
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PROJETO DE LEI Nº , DE 2008
(Do Sr. MANOEL JUNIOR)
Altera a redação do art. 333 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, o Código de Processo Civil.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º Esta lei altera a redação do art. 333 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, o Código de Processo Civil.
Art. 2º O art. 333 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, o Código de Processo Civil, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 333. O ônus da prova incumbe:
I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
§ 1º É nula a convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova quando:
I – recair sobre direito indispensável da parte;
II – tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.
§ 2º É facultado ao juiz, diante da complexidade do caso, estabelecer a incumbência do ônus da prova de acordo com o caso concreto.” (NR)
Art. 3º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
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