Nesta linha de pensamento o STJ, em acórdão cujo relator foi o Min. Raul Araújo, negou provimento a recurso especial interposto por ex-fumante (consumidor) sob o argumento, dentre outros, de que é inequívoco o conhecimento de que o cigarro é nocivo a saúde e, portanto, o consumidor deve observar tal alerta e não consumir volitiva e concientemente um produto que traz reconhecidos maleficios à saúde.
Neste passo, não haveria utilizade em aplicar o Código de Defesa do Consumidor para inverter o ônus da prova ou produzir provas.
Leia a ementa da acórdão:
EMENTA
RECURSO ESPECIAL.
RESPONSABILIDADE CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS.
TABAGISMO. EX-FUMANTE. DOENÇA E USO DE CIGARRO. RISCO INERENTE AO PRODUTO. PRECEDENTES.
IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
RECURSO DESPROVIDO.
1. "O
cigarro é um produto de periculosidade inerente e não um produto defeituoso, nos
termos do que preceitua o Código de Defesa do Consumidor, pois o defeito a que alude
o Diploma consubstancia-se em falha que se desvia da normalidade, capaz de gerar
uma frustração no consumidor ao não experimentar a segurança que ordinariamente
se espera do produto ou serviço"
(REsp 1.113.804/RS,
Quarta Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 24/6/2010).
2. Recurso
especial desprovido
(RECURSO ESPECIAL
- Nº 803.783 - RS (2005/0204934-4) - RELATOR:
MINISTRO RAUL ARAÚJO)
Abaixo os precedentes citados no acórdão:
"RESPONSABILIDADE
CIVIL. TABAGISMO. AÇÃO REPARATÓRIA AJUIZADA POR FAMILIARES DE FUMANTE FALECIDO.
PRESCRIÇÃO INOCORRENTE. PRODUTO DE PERICULOSIDADE INERENTE. INEXISTÊNCIA DE
VIOLAÇÃO A DEVER JURÍDICO RELATIVO À INFORMAÇÃO. NEXO CAUSAL INDEMONSTRADO. TEORIA
DO DANO DIREITO E IMEDIATO (INTERRUPÇÃO DO NEXO CAUSAL). IMPROCEDÊNCIA DO
PEDIDO INICIAL.
1. Não há ofensa
ao art. 535 do CPC quando o acórdão, de forma explícita, rechaça todas as teses
do recorrente, apenas chegando a conclusão desfavorável a este. Também inexiste
negativa de prestação jurisdicional quando o Tribunal de origem aprecia a
questão de forma fundamentada, enfrentando todas as questões fáticas e
jurídicas que lhe foram submetidas.
2. A pretensão
de ressarcimento do próprio fumante (cuja prescrição é quinquenal, REsp.
489.895/SP), que desenvolvera moléstias imputadas ao fumo, manifesta-se em
momento diverso da pretensão dos herdeiros, em razão dos alegados danos morais
experimentados com a morte do fumante. Só a partir do óbito nasce para estes
ação exercitável (actio nata), com o escopo de compensar o pretenso dano
próprio. Preliminar de prescrição rejeitada.
3. O cigarro é
um produto de periculosidade inerente e não um produto defeituoso, nos termos
do que preceitua o Código de Defesa do Consumidor, pois o defeito a que alude o
Diploma consubstancia-se em falha que se desvia da normalidade, capaz de gerar
uma frustração no consumidor ao não experimentar a segurança que ordinariamente
se
espera do
produto ou serviço.
4.
Não é possível simplesmente aplicar princípios e valores hoje consagrados pelo
ordenamento jurídico a fatos supostamente ilícitos imputados à indústria
tabagista, ocorridos em décadas pretéritas – a partir da década de cinquenta -,
alcançando notadamente períodos anteriores ao Código de Defesa do Consumidor e
a legislações
restritivas do
tabagismo.
5. Antes da
Constituição Federal de 1988 - raiz normativa das limitações impostas às
propagandas do tabaco -, sobretudo antes da vasta legislação restritiva do
consumo e publicidade de cigarros, aí incluindo-se notadamente o Código de
Defesa do Consumidor e a Lei n.º 9.294/96, não havia dever jurídico de
informação que impusesse às indústrias do fumo uma conduta diversa daquela por
elas praticada em décadas passadas.
6. Em realidade,
afirmar que o homem não age segundo o seu livre-arbítrio em razão de suposta
"contaminação propagandista" arquitetada pelas indústrias do fumo, é
afirmar que nenhuma opção feita pelo homem é genuinamente livre, porquanto toda
escolha da pessoa, desde a compra de um veículo a um eletrodoméstico, sofre os
influxos do meio social e do marketing. É desarrazoado afirmar-se que nessas hipóteses
a vontade não é livre.
7. A boa-fé não
possui um conteúdo per se, a ela inerente, mas contextual, com significativa
carga histórico-social. Com efeito, em mira os fatores legais, históricos e
culturais vigentes nas décadas de cinquenta a oitenta, não há como se agitar o
princípio da boa-fé de maneira fluida, sem conteúdo substancial e de forma
contrária aos usos e aos costumes, os quais preexistiam de séculos, para se
chegar à conclusão de que era exigível das indústrias do fumo um dever jurídico
de informação aos fumantes. Não havia, de fato, nenhuma norma, quer advinda de
lei, quer dos princípios gerais de direito, quer dos costumes, que lhes
impusesse tal comportamento.
8. Além do mais,
somente rende ensejo à responsabilidade civil o nexo causal demonstrado segundo
os parâmetros jurídicos adotados pelo ordenamento. Nesse passo, vigora do
direito civil brasileiro (art. 403 do CC/02 e art. 1.060 do CC/16), sob a
vertente da necessariedade, a ?teoria do dano direto e imediato?, também
conhecida como ?teoria do nexo causal direto e imediato? ou ?teoria da
interrupção do nexo
causal?.
9.
Reconhecendo-se a possibilidade de vários fatores contribuírem para o
resultado, elege-se apenas aquele que se filia ao dano mediante uma relação de
necessariedade, vale dizer, dentre os vários antecedentes causais, apenas
aquele elevado à categoria de causa necessária do dano dará ensejo ao dever de
indenizar.
10. A arte
médica está limitada a afirmar a existência de fator de risco entre o fumo e o
câncer, tal como outros fatores, como a alimentação, álcool, carga genética e o
modo de vida. Assim, somente se fosse possível, no caso concreto, determinar
quão relevante foi o cigarro para o infortúnio (morte), ou seja, qual a
proporção causal existente entre o tabagismo e o falecimento, poder-se-ia
cogitar de se estabelecer um nexo causal juridicamente satisfatório.
11. As estatísticas
- muito embora de reconhecida robustez - não podem dar lastro à
responsabilidade civil em casos concretos de mortes associadas ao tabagismo,
sem que se investigue, episodicamente, o preenchimento dos requisitos legais.
12. Recurso
especial conhecido em parte e, na extensão, provido."
(REsp
1.113.804/RS, Quarta Turma, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, DJe de
24/6/2010)
"RECURSO
ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS
MORAIS E MATERIAIS. TAGABISMO. EX-FUMANTE. DOENÇA E USO DE CIGARRO. RISCO
INERENTE AO PRODUTO. PRECEDENTES. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RECURSO PROVIDO.
1. 'O cigarro é
um produto de periculosidade inerente e não um produto defeituoso, nos termos
do que preceitua o Código de Defesa do Consumidor, pois o defeito a que alude o
Diploma consubstancia-se em falha que se desvia da normalidade, capaz de gerar
uma frustração no consumidor ao não experimentar a segurança que ordinariamente
se
espera do
produto ou serviço.' (REsp 1.113.804/RS, Relator em. Min. Luis Felipe Salomão,
DJe de 24/6/2010).
2. Recurso
especial provido."
(REsp
1.197.660/SP, Quarta Turma, deste Relator, DJe de 1º/8/2012)
"RECURSO
ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. FUMANTE. EXERCÍCIO DO
LIVRE-ARBÍTRIO. RUPTURA DO NEXO DE CAUSALIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 535 NÃO CONFIGURADA.
1. Tendo o
Tribunal a
quo apreciado, com a devida clareza, toda a matéria relevante para a
apreciação e julgamento do recurso, não há falar em violação ao art. 535 I e II
do Código de Processo Civil.
2. É
incontroverso nos autos que o Autor começou a fumar nos idos de 1.988, mesmo
ano em que as advertências contra os malefícios provocados pelo fumo passaram a
ser veiculadas nos maços de cigarro.
3. Tal fato, por
si só, afasta as alegações do Recorrido acerca do desconhecimento dos
malefícios causados pelo hábito de fumar, pois, mesmo assim, com as
advertências, explicitamente estampadas nos maços, Miguel Eduardo optou por
adquirir, espontaneamente, o hábito de fumar, valendo-se de seu livre-arbítrio.
4. Por outro
lado, o laudo pericial é explícito ao afirmar que não pode comprovar a relação
entre o tabagismo do Autor e o surgimento da Tromboangeíte Obliterante.
5. Assim sendo,
rompido o nexo de causalidade da obrigação de indenizar, não há falar-se em
direito à percepção de indenização por danos morais.
6. Recurso
Especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido."
(REsp
886.347/RS, Quarta Turma, Rel. Min. HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO -
Desembargador convocado do TJ/AP -, DJe de 8/6/2010)
"RECURSO
ESPECIAL - DIREITO DO CONSUMIDOR – ACÓRDÃO QUE, POR MAIORIA DE VOTOS, ANULA
SENTENÇA – NÃO CABIMENTO DOS EMBARGOS INFRINGENTES - PRECEDENTES - ARTIGOS 22,
DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, E 335 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL -
PREQUESTIONAMENTO - AUSÊNCIA - INCIDÊNCIA DA SÚMULA 211/STJ - RESPONSABILIDADE
CIVIL - FABRICANTE DE BEBIDA ALCOÓLICA - DEPENDÊNCIA QUÍMICA - INEXISTÊNCIA
- ATIVIDADE LÍCITA - CONSUMO DE BEBIDA ALCOÓLICA - LIVRE ESCOLHA DO CONSUMIDOR
- CONSCIÊNCIA DOS MALEFÍCIOS DO HÁBITO - NOTORIEDADE - PRODUTO
NOCIVO, MAS NÃO
DEFEITUOSO - NEXO DE CAUSALIDADE INEXISTENTE - FATO INCONTROVERSO – JULGAMENTO ANTECIPADO
DA LIDE - POSSIBILIDADE - DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA TÉCNICA -
PRECEDENTES - CERCEAMENTO DE DEFESA - RECONHECIMENTO DE OFÍCIO - INVIABILIDADE
- ESCÓLIO JURISPRUDENCIAL – RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA
EXTENSÃO, PROVIDO PARA JULGAR IMPROCEDENTE A DEMANDA INDENIZATÓRIA.
I - No v.
acórdão que, por maioria de votos, anula a sentença, não há juízo de reforma ou
de substituição, afastando-se, portanto, o cabimento de embargos infringentes (ut REsp
1091438/RJ, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 03/08/2010).
II - Os artigos
22, do Código de Defesa do Consumidor, relativo à obrigatoriedade de
fornecimento de serviços adequados, bem como o 335, do Código de Processo
Civil, acerca da aplicação das regras de experiência, não foram objeto de
debate ou deliberação pelo Tribunal de origem, restando ausente, assim, o
requisito do prequestionamento da matéria, o que atrai a incidência do
enunciado 211 da Súmula desta Corte.
III -
Procedendo-se diretamente ao julgamento da matéria controvertida, nos termos do
art. 257 do RISTJ e da Súmula n. 456 do STF, veja-se que embora notórios os
malefícios do consumo excessivo de bebidas alcoólicas, tal atividade é exercida
dentro da legalidade, adaptando-se às recomendações da Lei n. 9.294/96, que
modificou a forma de oferecimento, ao mercado consumidor, de bebidas alcoólicas
e não-alcoólicas, ao determinar, quanto às primeiras, a necessidade de ressalva
acerca dos riscos do consumo exagerado do produto.
IV - Dessa
forma e alertado, por meio de amplos debates ocorridos tanto na sociedade
brasileira, quanto na comunidade internacional, acerca dos malefícios do hábito
de ingestão de bebida alcoólica, é inquestionável, portanto, o decisivo papel
desempenhado pelo consumidor, dentro de sua liberdade de escolha, no consumo ou
não, de produto, que é, em sua essência, nocivo à sua saúde, mas que não pode
ser reputado como defeituoso.
V - Nesse
contexto, o livre arbítrio do consumidor pode atuar como excludente de
responsabilidade do fabricante. Precedente: REsp 886.347/RS, Rel. Min.
Honildo Amaral de Mello Castro, Desembargador Convocado do TJ/AP, DJe de
25/05/2010.
VI - Em resumo:
aquele que, por livre e espontânea vontade, inicia-se no consumo de bebidas
alcoólicas, propagando tal hábito durante certo período de tempo, não pode,
doravante, pretender atribuir responsabilidade de sua conduta ao fabricante do
produto, que exerce atividade lícita e regulamentada pelo Poder Público.
VII - Além
disso, '(...) O juiz pode considerar desnecessária a produção de prova sobre os
fatos incontroversos, julgando antecipadamente a lide' (REsp 107313/PR, Rel.
Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 17/03/1997, p. 7516.
VIII - Por fim,
não é possível, ao Tribunal de origem, reconhecer, de ofício, cerceamento de
defesa, sem a prévia manifestação da parte interessada, na oportunidade de
apresentação do recurso de apelação.
Precedentes.
IX - Recurso
especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido para julgar
improcedente a demanda."
(REsp
1.261.943/SP, Terceira Turma, Rel. Min. MASSAMI UYEDA, DJe de 27/2/2012,
grifou-se)